Questionário

Friday, 21 September 2012

Equívocos Reitorais

O Magnifico Reitor da Universidade de Coimbra (UC) dedicou parte do seu discurso de abertura do ano lectivo para apresentar duas propostas “que reputa de centrais para a compreensão e resolução da crise” – limitar constitucionalmente a divida pública e tributar as transacções financeiras – concluindo: “Taxemos os robots, taxemos o dinheiro, libertemos as pessoas”.

Infelizmente trata-se de propostas baseadas em dois equívocos muito generalizados na opinião pública. Vejamos porquê.

Um limite constitucional à divida pública é inaplicável em termos práticos e injustificável em termos teóricos. É inaplicável porque os países, tal como as empresas, passam ocasionalmente por situações excepcionais (crises, guerras, desastres naturais, etc.) durante as quais têm de usar crédito para além do que seria razoável em termos puramente prudenciais. Por isso, os limites teriam de ser frequentemente alterados ou violados o que não se coaduna com os princípios constitucionais da durabilidade e aplicabilidade universal sem excepções. Tal está amplamente confirmado nos países que introduziram esse tipo de regras e que quase todos os anos são obrigados a revê-las (por exemplo os Estados Unidos).

Na verdade, mesmo optando por um limite flexível ou vago do tipo “excepto em circunstâncias excepcionais as finanças públicas devem estar tendencialmente equilibradas”, esse princípio é injustificável teoricamente.

Sob o ponto de vista teórico e empírico é hoje inquestionável que o crédito é indispensável para o crescimento económico; por permitir aos empreendedores usar as poupanças dos investidores passivos, que de outro modo ficariam inactivas (“debaixo do colchão”) sob a forma de depósitos, notas ou barras de ouro.

Como a divida é o reverso do crédito, é indispensável que a mesma seja contraída por aqueles que têm projectos com melhor retorno. Tais oportunidades tanto podem existir no sector público como no privado. Por exemplo, certamente que a Universidade tem projectos com um retorno superior ao de uma nova discoteca ou fábrica de tijolos em Coimbra.

A identificação dos melhores investimentos não é tarefa fácil, mas os mercados livres e concorrenciais constituem tendencialmente o melhor mecanismo para o fazer. Por isso, se a Universidade estudar formas de tornar os mercados do crédito mais competitivos isso será mais rentável do que estudar falácias já conhecidas por mais enraizadas que elas estejam entre nós.

De facto, mesmo quando certos mercados financeiros transaccionam volumes que nos assustam pelo seu valor (por exemplo nos mercados de câmbios e de swaps sobre taxas de juro) tal, por si só, não justifica a introdução de um grão de areia (imposto) na sua engrenagem para desacelerar o seu crescimento (como o próprio Tobin reconheceu). O mesmo se pode dizer sobre a ideia de taxar a instalação de supercomputadores junto das plataformas de negociação.

Por isso o esforço que alguns governos desesperados para arrecadar receita andam a fazer para relançar a ideia de tributar as transacções financeiras é igualmente inaplicável e injustificável.

É inaplicável porque irá levar à fuga de uma actividade importante para outros mercados como Singapura ou Hong Kong. É injustificável porque a base de tributação de qualquer sistema justo e eficaz deve ser um mix de produção (onde já temos o IVA), rendimento (IRS e IRC), riqueza (IMI) e consumo (IVA, IA, Tabaco, etc.).

A circunstância de muitas vezes as administrações fiscais usarem como base da tributação as transacções é apenas um expediente para facilitar o seu trabalho de cobrança dos impostos. Tal facilitismo cria ineficiências, opacidade e distorções com um custo que muitas vezes excede largamente a poupança nos custos de cobrança. Infelizmente, isso pode ser facilmente comprovado em Portugal no actual sistema anacrónico e ineficiente de tributação do sector energético.

Também neste domínio, a Universidade de Coimbra devia preterir o estudo de impostos de base duvidosa ou de limitações ao uso de tecnologias de informação em favor de projectos mais produtivos. Por exemplo, estudar o impacto das tecnologias de informação na produtividade das organizações (incluindo a UC) e estudar formas de eliminar o labirinto fiscal no sector energético.

Em suma, a Universidade de Coimbra não deve correr atrás de modas falaciosas.

Nota: Com este “post” não pretendemos cometer a deselegância de comentar um discurso comemorativo da abertura solene das aulas e muito menos criticar a juventude, eloquência e dinamismo do nosso Reitor, atributos que muito apreciamos e que estão bem patentes no seu relatório de actividades. Apenas, e só, enquanto Professor de Finanças na UC não podemos deixar de refutar ideias erróneas que ultimamente têm contaminado a opinião pública em Portugal e na Europa.

Wednesday, 19 September 2012

Multiculturalism and Democracy

We define here multiculturalism in a narrow sense to include only major differences based on ethnicity or religion, leaving aside other rivalries created by geography or ideology.

Theoretically, one may expect multiculturalism and democracy to conflict or even to be irreconcilable, because people tend to rally around single issue parties along ethnic or religious lines.

In reality we find democracy in large multicultural countries like India, a country where 20% of the population follows a religion different from Hinduism, where cohabit more than 700 tribes, with 18 official languages and 450 linguistic groups.

In contrast we currently have many smaller multicultural countries like Syria and Iraq being ravaged by civil war. At the same time we have totalitarian multicultural countries like China, also a big country, where less than 50% of the population follow Shenism-Taoism and Buddhism among the Han Chinese and the other 55 official ethnic groups speaking 292 languages. Despite Mandarin being the only national official language in China, other languages like the Cantonese are also official languages at the regional level.

The question then is: why is multiculturalism consistent with democracy, tolerance and diversity in some places but not elsewhere?

One explanation is that democracy was possible where there was an over-riding cultural inheritance; often originating from the leadership of independence movements. India, where Gandhi’s party – the National Congress Party – dominated the political life in the first 25 years of independence, is such an example.

What makes the Indian experience interesting is how such party dominance could be ended in a peaceful way. Indeed, democracy survived despite the emergence of a plethora of small regional and ethnic parties and, at times, being governed by a 14-party coalition.

Many factors might have contributed for such outcome, but among the most important we must certainly include the choice of a federal system of government, the adoption of a unified and independent judicial system and the acceptance of coalition governments instead of a more traditional two-party rotation system.

All those currently pushing to jump towards political union in the European Union must think about these factors.

Sunday, 16 September 2012

QE3 or August 2007 again

Bernanke´s trick seems to be working again. Markets went into a significant rally last week following the FED´s decision to “expand its holdings of long-term securities with open-ended purchases of $40 billion of mortgage debt a month in a third round of quantitative easing”. The stated objective is to foster employment and growth but the real motive might be more mundane – to sustain the current bull market in real estate securities.

Back in August 2007 Bernanke also attempted to stop the impending market crash. It worked for a few months (see the S&P 500 chart below) but the inevitable correction came back with a vengeance, causing the second ever largest market crash in 2008.

Now, like then, there is a very large divergence between the price of financial assets and their underlying real assets. The divergence between a popular real estate ETF (IYR) and the prices of real estate as measured by the Case-Shiller Index is well illustrated in the following chart.

As we alerted in a previous post (markets behaving badly again), since a rally in real estate prices is not foreseeable without going back to high levels of inflation you can imagine the way the correction will go.

Saturday, 15 September 2012

Why the IMF therapy is not working in Ireland

After a remarkable economic success based on market capitalism, Ireland has drifted back into misery since the crisis of 2008 and risks turning into a Southern European type of state capitalism. Back in January 2011 we explained in this blog (see here) why the IMF program for Greece’s external adjustment would not work. Some of the reasons given then apply equally to Ireland (or Spain for that matter).

First, the Troika misdiagnosed the situation as a liquidity problem while in fact Ireland and Greece faced a solvency problem (albeit of a different nature).

Then, they treated the problem of excessive leverage in the wrong way. The two major mistakes in Ireland were the conversion of private debt into public debt and the reliance on internal devaluation to deleverage. It is easy to see why both policies were wrong.

Ireland had a typical situation faced by a family with irresponsible children that took excessive debt to pay for gambling losses at the Casino (or in its case to speculate in real estate). An obvious option to erase gambling debts was to default on the casino loans (in the case of the Irish real estate bubble the British and German banks). They could be charged with allowing bets that the gambler could not pay. One alternative would be to demand a debt restructuring involving partial debt forgiveness and a longer repayment period, so that with the help of family and friends (i. e. grants by national and EU institutions in the case of Irish borrowers) they could repay the remaining debt without damaging the credit of his family. Another alternative would be to ask the casino to accept an IOU without a redemption date (in case of the British and German banks accept money printed by the ECB).

Yet, the casino owners decided instead to force the collection of their loans from the children’s parents (i.e.Irish government). To save its reputation the family promised to honor the debts by putting them in their business balance sheet (the state budget in the case of Ireland). However, the debts were so huge that they would necessarily cripple an otherwise successful business (economy). It is easy to see why.

First, such an increase in leverage would bar the firm from market financing. Second, it would be forced to halt all modernization and maintenance investments. Finally, it would force the family to downsize by selling some of the best assets. Combining these three measures would inevitably lead to a lower competitiveness, declining productivity and a depressed local economy. As expected, in the last four years, investment in Ireland more than halved in real terms, while domestic demand declined by about one third.

However, the recourse to internal devaluation only made things worse. Imagine that the clientele of the parents business was mostly local (i.e. produced non-tradable goods in economists’ parlance). Therefore, cutting the wage of their workers would reduce its sales proportionally and reduce further the firms’ debt capacity.

Moreover, reducing nominal contracts in the labor market without a concomitant reduction in credit markets would inevitably lead to an increase in non-performing loans (which in 2011 indeed rose from 12% to 20%).

It is obvious that the policy of switching the debt burden from the private to the public sector only made things worse in Ireland. What we said about Greece applies equally to Ireland. It has only three options: a) to force a significant hair-cut on its bond-holders, b) to receive a major grant from other EU countries, or c) a mix of both. None of these is a pleasant solution but there is no other way out.

Friday, 14 September 2012

Is the IMF playing ostrich in Ireland?

Since December 2010, Ireland has diligently implemented an adjustment program agreed with the so-called Troika (IMF, ECB and EU). On its 6th review in June 2013, the IMF concluded that: “Ireland’s ownership of the program remains strong and policy implementation has continued to be steadfast despite the considerable challenges. All quantitative targets for the review were met, maintaining the strong performance in earlier reviews. Fiscal, financial, and structural reforms are advancing as envisaged”. Yet, the IMF seems intent on deliberately ignoring its failure (or lying), because it acknowledges in the same report “renewed tensions in the euro area have driven up Irish bond spreads, while growth remains weak and unemployment high”.

Indeed, in terms of both costs and results, the outcome is appalling. Let us look at the results first:

The chart above from the IMF report shows that the borrowing costs are higher than at the start of the program, remain at unsustainable levels and recently have resumed its rising trend. Likewise, the external debt shows no signs of abating, as shown in the next table:

The Irish net external debt position (excluding FDI and Reserves) deteriorated 16.8% (€30 billion) since the start of the program. Moreover, the government takeover of private debts has increased the general government debt from 25% of GDP in 2007 to 108% in 2011 and the IMF forecasts that it will increase to 121% of GDP in 2013.

Finally, let us look at the bank recapitalization. This program was pursued through a staggering increase of Tier I capital to 16%, but it did not solve the banking system solvability and profitability. The IMF table reproduced below shows that equity losses were still 20% in 2011, while the percentage of non-performing loans had increased from 12.1% to 19.5%.

So far for the results!

Unfortunately, the adjustment costs are equally dismal. The following table gives further details:

Suffice to say, Irish production (GNP) is still 11.8% less than it was four years ago and may fall again in 2012. Meanwhile, unemployment has reached 15% and might continue to rise despite a return to massive emigration. For instance, it is estimated that between 1976 and 2011, about 7.5% of native Irish in their twenties emigrated.

With such dismal results obtained at such an appalling cost, one must conclude that the IMF is playing ostrich in Ireland. Indeed, some observers may even wonder whether Ireland will become another Greece. So, it is not too soon to question whether the program is taking too long to work or it is fundamentally flawed.

Wednesday, 12 September 2012

No país do faz de conta

Já não bastava vivermos num país onde governantes como Miguel Relvas, Sócrates e outros ex-jotas fizeram de conta que tinham tirado uma licenciatura. Também agora a Troika, para disfarçar que não sabe o que anda a fazer, faz de conta que o dito “bom aluno” passou na 5ª avaliação. Na verdade, tal como um professor ajuda os alunos fracos dando-lhes mais tempo e uns valores a mais, também a Troika teve de dar ao governo mais dois pontos percentuais e mais um ano para cumprir os objectivos para o défice.

Depois do desastre da Grécia, a Troika precisava desesperadamente de mostrar que a sua terapia baseada numa desvalorização salarial funciona numa zona monetária. Por isso, desde o início que isentou Portugal da maioria dos objectivos quantitativos tradicionais e irá continuar a fingir que o país está a cumprir as metas enquanto a situação da população e da economia se degrada cada vez mais.

Por sua vez o governo fingiu que ia resolver o problema do défice pela via da despesa e não da receita. Lembram-se dos famosos 1/3 de receita e 2/3 de cortes de despesa para reduzir o défice em 7,5 mil milhões de Euros? Pelos vistos a execução orçamental até à data mostra uma quebra acentuada nas receitas e uma redução das despesas insignificante (se excluirmos os cortes nos salários da função pública e nas reformas).

Um exemplo ilustrativo desta política do faz de conta do governo é por demais evidente nos tão falados cortes nas PPPs e nas rendas excessivas dos oligopólios concessionados.

Por exemplo, a dita renegociação das PPPs foi uma montanha que pariu um rato. Segundo a comunicação social o governo terá poupado nesta 1ª fase da renegociação perto de mil milhões de euros (isto é, 1/3 do total previsto). Desconheço se a esse montante foi deduzido o montante das indemnizações a pagar aos concessionários por quebra de contrato. De qualquer forma a poupança é fictícia pois tratou-se apenas de cancelar obras por iniciar ou em curso e da transferência de responsabilidades nas obras de manutenção. Imagine que você tinha contratado fazer um prédio de 10 andares mas como não conseguiu a totalidade do financiamento instruiu o construtor para construir apenas 5 andares. Chamaria a essa redução poupança? Claro que não! Considerava que tinha cancelado, adiado ou reduzido o seu investimento.

Também esta semana o governo anunciou uma vitória dizendo que iria reduzir 140 milhões de euros nas rendas das eólicas para os próximos 8 anos. Trata-se de 17.5 milhões por ano, ou seja, um montante inferior aos cerca de 20 milhões anuais que só a EDP irá poupar com a proposta de redução da TSU, que se destinam a reduzir a divida do estado aos produtores de electricidade resultantes do chamado défice tarifário. Recordo que esta divida, que em 2011 acumulou 47 milhões em juros, resulta na sua maioria de atrasos no pagamento dos subsídios prometidos às produtoras para manterem inactivas as centrais eléctricas com custos de produção mais baixos do que as eólicas.

Para perceber o faz de conta desta poupança o leitor imagine que prometia ao seu filho uma mesada de 3 mil euros para ele poder viver sem trabalhar durante trinta anos mas que só lhe pagava 2 mil euros ficando a dever-lhe os restantes mil. O que é que acontecia se agora lhe dissesse que lhe cortava 100 euros na mesada? Nada! Ele continuava a viver sem trabalhar com os 2 mil euros enquanto você fingia que agora já só lhe devia 900. Ele continuava a fazer de conta que a sua mesada era superior a 2 mil euros e você fazia de conta que tinha menos divida.

A mesma política do faz de conta está a ser seguida em inúmeros sectores. Por exemplo, ao fazer-se de conta que está em curso uma reforma da administração pública substituindo os quadros de dirigentes da função pública por jovens estagiários da “jota” a ganhar chorudos ordenados de 4 e 5 mil euros. Ou, quando se faz de conta estar a cortar no ensino aumentando o número de alunos por turma para 30 e depois se deixam milhares de professores com horário zero mas a receber o respectivo vencimento.

Até quando irá continuar esta irresponsabilidade? Até os credores se cansarem do faz de conta da Troika ou até a situação em Portugal se ter agravado tanto como na Grécia e sermos forçados a deixar o Euro? Esperemos que haja o bom senso de arrepiar caminho a tempo.

Sunday, 9 September 2012

Orçamento 2013: Economicus Ignoramus ou pior a emenda que o soneto?

Os economistas usam frequentemente o chamado Homo Economicus, para descrever um agente económico representativo. Hoje vou escrever sobre os malefícios de uma outra espécie que abunda em muitas instituições internacionais e em particular no Banco Central Europeu – o Economicus Ignoramus.

Esta espécie é maioritariamente constituída por fundamentalistas da escola monetarista e por “novos clássicos” que, ignorantes de tudo o que se aprendeu sobre gestão macroeconómica, continuam a acreditar em sangrar o paciente (isto é, a economia) até à exaustão na expectativa de que a fada mágica da confiança venha relançar a economia. Em particular, acreditam que a baixa sucessiva dos salários nominais trará uma retoma económica em vez do agravamento da recessão.

Vítor Gaspar, o nosso ministro das finanças, enquanto funcionário do BCE era considerado como um elemento moderado dessa espécie de ignoramus. Por isso, foi com surpresa que vimos o Primeiro-ministro Passos Coelho anunciar a medida mais estupida que essa espécie jamais quis experimentar até hoje. Refiro-me à proposta de aumentar marginalmente os impostos sobre o trabalho de 34.75% para 36%, mas com uma redução do salário nominal dos trabalhadores (antes de IRS) em 7.7% que seria parcialmente utilizada para reduzir os custos laborais para as entidades patronais em 4.7%.

Contrariamente à redução dos salários reais por via inflacionista ou do aumento dos horários de trabalho, os cortes nos salários nominais é contraproducente por reduzir desnecessariamente a procura interna agregada tal como foi demonstrado por Keynes há mais de 75 anos (ver por exemplo o capítulo 2 da sua Teoria Geral). Também a reacção pouco entusiasta dos empresários Portugueses, supostamente beneficiados com essa redução, corrobora a teoria Keynesiana.

Uns simples cálculos “de guardanapo” ilustram a irracionalidade desta medida. Vejamos primeiro porque é que os empresários não estão entusiasmados com os 4.7%. Eles sabem por experiência que baixar os salários líquidos vai causar ressentimento entre os seus trabalhadores com duas reacções inevitáveis: um pedido de aumento salarial compensador e ou uma redução do seu empenho no trabalho que reduz a sua produtividade. Eles também antecipam que os trabalhadores dos sectores regulados e dos transportes farão valer as suas reivindicações e que as respectivas empresas oligopolistas farão repercutir o aumento dos custos no preço a cobrar pela energia, crédito e transportes às restantes empresas.

Por isso, basta que estas repercutam a totalidade dos custos de reposição dos salários líquidos dos seus trabalhadores para que as restantes empresas tenham um acréscimo de custos na ordem de 0.7%. Se as restantes empresas perderam mais 2 a 3% por via da reposição de salários e quebra de produtividade então o ganho final será provavelmente inferior a 1%. Será que tal benefício constitui uma vantagem competitiva? Claro que não! As empresas exportadoras são sobretudo vulneráveis a uma valorização do Euro e as que trabalham para o mercado interno serão drasticamente afectadas pela contracção no consumo privado.

Na verdade esta redução no rendimento nominal será a mais desastrosa para a economia portuguesa por agravar o crédito mal parado e reduzir o consumo privado. Como as remunerações dos assalariados representam cerca de 50% do PIB em Portugal, o aumento de 7% da contribuição para a segurança social poderá traduzir-se numa redução do consumo privado em cerca de 1.75% do PIB, à qual podemos acrescentar mais 0.8% de contracção resultante do efeito multiplicador sobre o desemprego causado por essa medida. Deste modo a previsão do Banco de Portugal para um crescimento zero em 2013, deverá ser revista para uma quebra de 1.5%. Isto é, o país continuará em recessão em 2013.

Em suma, a esperteza saloia de querer fazer o triplo e com esta engenharia tributária agradar à Troika introduzindo a sua desejada desvalorização salarial de 7%, enganar o Tribunal Constitucional dissimulando o não cumprimento do princípio da equidade e satisfazer os lobbies contra o aumento dos impostos sobre o capital, irá traduzir-se num efeito negligenciável sobre as contas públicas (senão mesmo negativo), num agravar absurdo das desigualdades, no aumento imparável do crédito mal parado e do desemprego (que poderá aproximar-se dos 20%) e numa quebra significativa do PIB nacional.

Com as perspectivas resultantes desta inépcia (ou perfídia?) do Governo não será de admirar que os nossos credores continuem sem acreditar em Portugal e teremos de concluir que será pior a emenda que o soneto.